Por não conter o status de Língua, como a palavra altamente codificada, a ilustração possui uma linguagem ainda em construção, por isso possibilita uma adesão do espectador sem que ele a decifre logo de início. Há, na construção do texto estético, muito além do que se quer dizer, a tensão do ponto, o incompleto da curva a expressividade do traço. Neste caso, a imagem somente se dá no ato de leitura. O processo da leitura promove uma sensação de pertencimento ao texto, uma conexão ao que está sendo lido. As imagens estão para representar idéias, que existem para se ligarem a outras e fazerem pensar criativamente e criticamente. Segundo Umberto Eco, o texto estético é um exemplo de criação. Para mim é criação não pretende definir conceitos, apenas os apresenta. É pela experiência da leitura que a arte se expressa: formas, cores, estruturas lúdicas,trazendo um conteúdo que está presente, que se vê, embora muitas vezes não consigamos explicá-lo. A imagem estimula sensações. Sensações que às vezes não requisitam significados para serem compreendidas. Muitas delas são metáforas. Freud acreditava que metáfora servia por ainda não existir uma palavra para definir o objeto em questão, que faz parte de um processo de evolução e por um tempo se torna necessária. Acredito que há mais na metáfora, ela serve para estimular o que é obscuro. A sensibilidade, os sentidos. Ora, se fôssemos apenas racionais, repletos de respostas para tudo, não precisaríamos nos preocupar com essa sensação de incompletude individual e sentimento de coletividade. Waking Life, por exemplo, comunica visualmente, conta e narra através de ilustrações (animações) lúdicas. O prazer, outro aspecto fundamental da obra em questão – o prazer é sentimento próprio do ser humano que se expõe através do riso – uma das formas básicas de sensação,um dos primeiros movimentos do bebê quando nasce – prazer e riso são intrínsecos ao homem – o humor. É necessário para o seu bem estar. Com ele há um extasiamento, um desprendimento das regras impostas por dominação seja social ou cultural. Waking Life se utiliza de imagens cheias de riso, prazer e ironia. As imagens passam do belo ao grotesco com uma naturalidade próprias da banalização da violência. As personagens são transeuntes dissertando sobre os assuntos mais filosóficos com a maior da naturalidade e em clima onírico. O espaço flutua, indefine e modifica. Podemos comparar a proposta do filme ao que Alain Resnais, no Noveau Romance defende com histórias oníricas onde palavra passa a significar imagem e imagem significar palavra. Interpretamos o sonho como intenção de se aproximar da realidade, da construção. É o fantástico abaixo da superfície do realismo – que o sustenta, que o estrutura. Estamos falando do alicerce; do que poderia se chamar de estrutura ausente por Umberto Eco, do que não se vê, das metáforas, da ponte que o texto literário traz para narrar uma imagem e que o texto estético traz para narrar uma história. A intenção do filme é de comunicar algo. O tempo é atual e os diálogos próximos ao cotidiano. Visto ser um filme repleto de diálogos na imagem, podemos considerar de narrativa visual marcante. Porque a ilustração indefinida? As animações oníricas e difusas, o sonho para justificar uma busca? Agora podemos entender que o que o filme quer passar é o processo, o caminho, a vida acordando. Mas porque não fotogramas? Imagens reais? Por que ao definir todo o processo de apreensão, podemos estar reduzindo um processo em um significado apenas, quando este tenta definir os códigos. Essa tentativa de abrir um pouco a interpretação, com traços lúdicos, figura e fundo que de fundem, se completam e indefinem possibilitam interpretações próprias por cada espectador – estão mais próximas do lúdico, do fantasiosos, ou seja, do processo de semiose. O conteúdo da mensagem se torna mais flexível, pois cada indivíduo faz analogias com o que já conhece para identificar informações sugeridas no texto visual: a figura não está ali pronta, está sendo construída. Se definirmos todos os signos visual criaremos uma realidade imposta, uma matrix, uma virtualidade – ou visualidade irreal, pois só pode existir a representação se houver leitura. Com a leitura estética, o leitor pode optar por descansar do processo de leitura e contemplar a criação, o que chamaria Hjemeslev de material amorfo, daquilo que está ali como matériaprima pronto para usarmos nas combinações, a ponte para gerar significaods a partir do repertóriod e cada um.
A Arte no campo da Estética está para simplificar o momento, assumir a incompletude e assim poder se completar – retira-nos do momento temporal e ‘atempora’ a experiência. Um prazer que transcende o tempo porque não precisa nem dele nem do contexto para significar nada. Está ali, sendo sentido. Em alguns momentos no filme há também as imagens esquemáticas, que servem para fechar a imaginação e definir exatamente o que quer ser dito, diferem do papel da ilustração. Para essa definição de que esquema significa um símbolo, fechado, que também situa o leitor em uma dada sociedade codificada. O filme Waking Life traz questões profundas, filosóficas e essa maneira de representar a imagem é bastante feliz para reportar ao sonho, ao espaço que transcende.
domingo, 21 de março de 2010
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